29/03/12

De Mannheim (1900) a Salamanca (1995): Currículos alternativos ou classes especiais ?


A individualização pedagógica não é assunto novo. Sempre os pedagogos e os psicólogos se preocuparam com esse tema (Planchard, E. (1979), Introdução à pedagogia, Coimbra Editora, Lda, pag.s 160-173). E acentuou-se essa necessidade à medida que a sociedade se foi diversificando e que as organizações como realidade complexa se vão desenvolvendo.
Todos diferentes, todos iguais, um slogan conhecido, mas que não passa disso, sem significado para muitos.
A colectividade é constituída por seres semelhantes em muitos aspectos, mas cada indivíduo é um só
com capacidades e atitudes diferentes dos outros, com direitos e deveres comuns e com possibilidade de igualdade de oportunidades semelhantes.

São assim questões fundamentais do ponto de vista psicológico, social e político.
1. Um despacho potencialmente perigoso
As reacções ao despacho 22, inicialmente ténues, mereceram a designação de despacho polémico. Cada vez mais vão aparecendo novas configurações da perigosidade de tal orientação.
Partindo do princípio de que não há pessoas iguais, também não há crianças iguais. Também não há crianças com necessidades educativas iguais.
A generalização a partir do pressuposto de que é possível criar grupos homogéneos do ponto de vista cognitivo e comportamental é bastante arriscada se não mesmo impossível. Mais grave ainda se esta generalização abranger todos os níveis etários.
Se vamos começar a aplicar esta medida ao primeiro ciclo, por que não começar na creche ou no
jardim de infância?
Para nós não há crianças com necessidades educativas especiais iguais. E nesta perspectivas apenas os currículos alternativos individuais podem ser medidas ajustadas às necessidades da criança.

2. Um despacho declaradamente ocioso
A legislação existente era suficiente e permitia às escolas actuarem de acordo com as suas necessidades e de acordo com as necessidade de que a sua população escolar necessitava. Sem necessidade de criarem classes especiais ou de enveredarem mais uma vez por processos burocráticos de constituição de turmas de exclusão.
Referimos apenas a legislação sobre apoio pedagógico acrescido e as estratégias definidas de apoio pedagógico (Desp.178 -A/ME/93, de 30-6 e o Desp. sobre constituição de turmas (Desp. Conj 112/SERE/SEEBS/93).
Todas estas medidas possíveis de serem articuladas com o ensino especial (Dec-Lei nº 319), apoio pedagógico acrescido, apoio dos serviços de psicologia e orientação, etc.

3. Prática pedagógica positiva
Este despacho vem ao arrepio de toda uma prática pedagógica que as escolas vinham desenvolvendo que era suficiente, de inclusão, de apoio às necessidades dos alunos e não potencialmente geradora de exclusão.
É uma machadada em todo o contexto que vinha sendo perspectivado a nível da educação integrada em que seria importante todo o processo de integração social, educativo e curricular.
Provavelmente este despacho tem uma vantagem: resolve os problemas de alguns professores, de algumas instituições/escolas, da ausência dos tipos de respostas como os serviços de psicologia e orientação, da saúde escolar, da educação especial deficitária a nível do 2º e 3º ciclos, da falta de técnicos de educação, da falta de técnicos de terapia, etc...
Mas não irá resolver o problema dos alunos e consequentemente os problemas da sociedade.
 
 
Nota 1: No ano de 1947, as escolas reclamam junto do Instituto Aurélio da CostaFerreira que se abram classes especiais. São abertas 14 classes especiais junto das escolas de Lisboa e duas classes especiais junto das escolas do Porto.

Nota 2:  Texto escrito após a publicação deste "famoso" despacho e por isso datado. Em todo o caso a conclusão mantém-se. Sabem quem era a Secretária de Estado da Educação ?

Os pilares da reforma curricular.

(Kaufman et al. 1969)

Periodocamete, "assistimos" a reformas curriculares. As bases de justificação em que assenta qualquer reforma curricular nem sempre são evidentes. Pelo contrário, são até fonte de grande controvérsia, consensos, pseudo consensos e compromissos.
Kaufman (1969) * há muitos anos definia os três pilares do currículo: a sociedade a servir, o sujeito a ensinar e o conhecimento a ensinar.
A sabedoria para efectuar uma reforma curricular não depende desta ou doutra governação mas da capacidade que os governantes possam ter para perceber quais são as mudanças  da sociedade e da cultura que justificam a mudança curricular.
Mas, em primeiro lugar, para se mudar é porque se parte da constatação de que a escola não está a trabalhar bem. Mesmo que digamos que temos uma escola para todos, obrigatória e inclusiva. Ou será que os governantes anteriores  consideram que fizeram um bom serviço na educação?
Em segundo lugar, é necessário saber que o universo do conhecimento é, sem dúvida, de uma grande complexidade. Seria simplismo não perceber que nos últimos 10 anos houve mudanças profundas na sociedade da informação e do conhecimento.
Então caiu-se naquilo que é hoje a escola: cada vez mais áreas a incluir no currículo. Como o tempo não é ilimitado algumas vão-se arrumando na formação cívica ou noutras áreas, como foi o caso da educação sexual.
E todos os dias surgem mais propostas para criar novas disciplinas e/ou novas áreas em que é preciso educar o aluno: a defesa do consumidor, a economia e utilização da banca, a segurança rodoviária, a protecção civil, a educação para a saúde, o ambiente, os media, etc.
Claro que teríamos que chegar a este ponto, como está a fazer agora Nuno Crato. Era de prever que  a escola deveria cingir-se aos conhecimentos fundamentais ao serviço do futuro cientifico e técnico (Oliveira, F. (Org.), Eduquês: um flagelo sem fronteiras - o caso Lafforgue), sendo o grande motivo desta reforma: as medidas mais importantes passam por reforçar as áreas disciplinares fundamentais.
Outras medidas podem trazer algo de novo:
- No campo das artes, afirmar a identidade de disciplinas que se reúnem sob a designação de Expressões (Educação Visual, Educação Musical, Educação Física e Educação Tecnológica);
- A duração das aulas fica ao critério da escola. Do mal o menos. Um erro é sempre um erro. E este foi um erro da anterior reforma. As aulas de 90 minutos são um erro, dado o que sabemos da capacidade de atenção dos alunos e dos dados fornecidos pela biologia relativamente à capacidade de atenção dos alunos e à maturação do sistema nervoso central (SNC).
Parece que a escola vai poder optar por vários tipos de tempos. Já é um progresso.
Obviamente que pode haver disciplinas onde faça sentido haver dois tempos: na educação física , em EVT (EV/ET).
Por outro lado, há aspectos que devem ser fortemente criticáveis, como são as chamadas turmas de nível. Pois é. Sempre as criticámos. O que não fizeram outros.
E aqui entramos no reino da  incoerência política dado que os anteriores governantes esqueceram-se rapidamente das medidas que tomaram, aliás mantidas pelo actual ministério:
- O que são os PCA (percursos curriculares alternativos)?  O que são os PIEF ? O que são a maioria dos CEF ? O que são muitas turmas de escolas TEIP ? Não são turmas de nível ? Claro que são.
É por isso que é mais honesto, em primeiro lugar, verificar que não há soluções assim tão fáceis para resolver o insucesso escolar, nem cá nem em países mais desenvolvidos.
Depois valerá a pena fazer um currículo juntos, encontrar consensos, de forma a poder estabilizar o sistema que bem precisa.

* Referido por A. Carrilho Ribeiro, 1996, Desenvolvimento curricular, fig. 9.
Este esquema apresenta uma visão das fontes do currículo em qualquer sociedade. Nele se inclui o professor, presente nestes três pilares, enquanto integrante da relação pedagógica, vinculação com a sociedade, com o conhecimento e a cultura. 



21/03/12

Pais suficientemente bons *

                          
Passou esta semana mais um dia do pai. Felizmente, ainda há quem comemore o dia do pai, embora o importante aqui é o pai e não a comemoração do dia. Quanto ao dia do pai não ignoro as complicações que isso costuma gerar na escola e na turma para alguns alunos e professores. De facto, se é verdade que todos têm um pai e uma mãe, isso, às vezes, não é verdade do ponto de vista formal, digamos assim. Além disso, os pais muitas vezes estão ausentes geograficamente e frequentemente estão ausentes afectivamente. Muitas situações destas não são evitáveis, no mundo em que vivemos. Continua a ser um mundo de violência em que as perdas devido a guerras, a acidentes de viação e de trabalho, de emigração ou, simplesmente, da vida moderna e de estilos de vida que as pessoas escolhem, fazem com que muitas crianças não tenham pai.
Por estranho que pareça e que pensávamos ter acabado depois do 25 de Abril, ainda temos filhos de pai incógnito. Será que um filho não tem o direito de saber quem é o pai ? Já não digo conviver com o pai. A Convenção dos direitos da criança diz que a criança tem direito a conhecer os seus pais.
Mas parece que há pessoas que podem desrespeitar este artigo da Convenção.
E se um filho quiser conhecer quem é o seu pai, o que vai fazer o estado, a justiça ? Esta será uma situação cada vez mais questionada no futuro.
Certamente que a escola pode sempre ser sensível as estas situações. E deverá lidar com elas com muito bom senso porque há crianças para quem há lutos a fazer, e sofrimentos pelas perdas reais e simbólicas que acontecem nas suas vidas.
Também me parece muito exagerada a atitude de querer tirar o pai da família.
Tanto quando se sabe, o pai é muito importante para o desenvolvimento de uma criança.
A palavra bebé estava ligada à mãe mas compreendeu-se (estudos a partir de 1976) que havia interacções muito importantes entre o pai e o bebé. Os pais descrevem mesmo o nascimento do filho como um acontecimento extraordinário e maravilhoso…
O pai pode juntamente com a mãe prestar cuidados maternais ao bebé.
Alguns jogos são tipicamente do pai com a criança, principalmente os jogos corpo a corpo, como atirar o bebé ao ar.
O pai é mais activo, mais brusco, mais audacioso, favorece a independência e a autonomia…
Por volta do sexto mês a mãe introduz este estranho na relação com o bebé. O pai passa assim a fazer parte da interacção como um rosto familiar.
Por isso uma ausência real pode ser uma presença simbólica: O pai pode estar presente, o pai da fotografia que a mãe mostra ao filho, os objectos que lhe dão significado e as palavras que o descrevem.
A patologia surge quando há uma ausência de ausência. A negação deste ser que é o pai.
O pai marinheiro ou o pai emigrante é um ausente falado: o papá não está, o papá vai chegar, o papá vem de férias… é um pai significado através de objectos que lhe pertencem, a fotografia, a roupa, etc.
Por isso, temos saudades. O que nos faz ter saudades? A ausência que, como diz o povo, tem uma filha que se chama saudade. Só pode ter saudade quem tem uma boa relação com o companheiro que o significa junto da criança.
Por isso, saudade é uma palavra tão presente na poesia de amor e na música popular. Saudade é um sentimento de perda, de ausência mas também de amor.
Por isso, temos saudades da mãe mas também do pai.
Um abraço a todos os pais.

* Expressão de Winnicot, no livro em epígrafe, "razoavelmente", que em  B. Betelheim, Bons Pais, é "suficientemente".

"Natureza morta com flores do prado e rosas"

Holanda - Descoberta nova obra de Van Gogh

16/03/12

Cooperação e educação


A escola é um local privilegiado para o desenvolvimento da cooperação e da solidariedade.
A cooperação dentro da escola apresenta aos alunos uma visão realista da sociedade e implica, na sua prática, a interacção na sala de aula e o exercício dos direitos e deveres enquanto alunos e cidadãos.
Mais do que um método pedagógico, a cooperação é uma característica da inteligência emocional. É uma dimensão da personalidade relacionada com o desenvolvimento dos valores: saber ouvir e respeitar o outro, partilhar saberes, entreajudar nas forças e fracassos, responsabilizar pelas atitudes e comportamentos e ganhar autonomia.
Pode traduzir-se em documentos formais como o projecto educativo de escola ou de turma mas a sua aplicação concreta faz-se todos os dias nas várias disciplinas através dos valores que são aprendidos e postos em prática na vida dos alunos: a ajuda a um colega com cadeira de rodas, a ajuda a um aluno instável ou com dificuldades de aprendizagem, a tolerância para com os comportamentos desajustados dos outros, a partilha de uma mágoa, a generosidade de professores, técnicos e funcionários em relação à obtenção dos objectivos da escola, o tempo não contabilizado para apoiar um aluno directa ou indirectaramente, a colaboração com a rede de instituições de apoio à infância e juventude, a atitude compreensiva nas relações humanas, o contributo para um ambiente menos intimidante e para uma cultura de paz e segurança…
A prática da cooperação traduz-se na modificação do comportamento na medida em que impossibilita ou dificulta o comportamento incompatível: a violência, as incivilidades, o bullying, a insegurança…
A cooperação situa-se do lado das forças de cada um e dessa forma é uma força da instituição escola, ajuda a ter uma imagem positiva de si próprio e da escola, fortalece a identidade pessoal e colectiva.
A cooperação não é oposta a competição nem exclui a competição. O “nós” não tem que apagar o “eu” e “tu” pelo contrário quando a maré sobe todos os barcos, pequenos ou grandes, novos ou velhos, bonitos ou feios, sobem com ela.
A cooperação na escola não pode ser alheia à competição na sociedade sob pena de todos estarmos a ser enganados. É mesmo necessário preparar os alunos para uma sociedade competitiva e desenvolver o espírito de liderança.
Deste modo uma atitude cooperativa/competitiva não significa rivalidade nem falta de solidariedade, não diminui a auto-estima nem aumenta o medo de falhar, a frustração e agressão.
A cooperação deve manter a integridade do Eu e manter a coerência entre os vários “módulos” do homem moderno, entre os vários “pedaços” da vida da família e da comunidade que os alunos trazem e partilham na escola. Por isso, tanto a escola como a família são igualmente responsáveis pela cooperação, competição e pela educação axiológica dos alunos.
Os pais não devem temer dizer aos filhos que podem competir nas várias áreas da vida, de uma forma saudável, e, simultaneamente, que devem cooperar com os colegas para uma vida mais feliz.
O Cristiano Ronaldo e o Lionel Messi não deixam de ser competitivos mesmo quando cooperam com a equipa para ganhar os jogos em que participam.

12/03/12

"Sensatos e serenos"

(O  Insurgente)

A semana que passou mostrou bem que se discutem assuntos interessantes (lusoponte, a falta de lealdade de Sócrates, que já todos conheciam, mas o que parece que interessa é o timing do Sr. Presidente, o ministério da economia, a senhora que nomeou o marido, a censura a Mário Crespo...) mas o verdadeiro problema é mesmo de cultura e de mudança de mentalidade.
O programa "olhos nos olhos" de hoje, sobre as PPP, deu a verdadeira dimensão, assustadora, do que foi que nos trouxe aqui. Se não fosse a banalização da palavra diria que fiquei chocado. Até 2050 vai continuar o saque (Medina Carreira)...
Felizmente, conforme também disse Medina Carreira, os portugueses são sensatos e serenos.



Actualizado em 16-3-2012

07/03/12

"The finite pie"



O que está então em causa na situação portuguesa?
É meu hábito dizer que não pode haver desenvolvimento sem uma matriz cultural que dê forma e sentido a todas as etapas. Mas hoje vou um pouco mais longe. O desenvolvimento, tal como foi vivido pelos portugueses neste dez anos, é basicamente um problema cultural.
Primeiro, porque não é só o colapso económico que está em causa num país como Portugal. Se há um colapso óbvio, é o colapso da economia enquanto ciência e daqueles que a exprimem. É tempo que isto seja dito num contexto cultural. Notáveis economistas o têm dito em diversos termos: Kenneth Boulding, Gunnar Myrdal, Barbara Ward, Rostow, Hazel Henderson. É de um livro desta última economista americana, num artigo intitulado The finite pie, que posso citar a seguinte frase: «As anomalias a que os economistas não são capazes de fazer face estão agora dolorosamente visíveis, quer na inflação global, quer na poluição, quer nos efeitos laterais não desejados do desenvolvimento económico, tais como a disfunção social, a urbanização desastrosa, os elevados custos da infra-estrutura, o desemprego e a má distribuição do rendimento e da riqueza».
Com efeito, a economia mostrou já em todo o mundo que, tal como existe, não consegue fazer face aos nossos problemas internos nem, tão pouco, às associações regionais e à gestão global dos recursos mundiais.
Se, durante a última hora, 1.800 crianças morreram de fome e de má nutrição no mundo, isto não pode ser olhado como um caso moral e resolvido por apelos à generosidade, mesmo que esta seja extremamente positiva e importante do ponto de vista pessoal.
Trata-se, isso sim, de mostrar que, num tempo planetário, a economia que conhecemos não nos dá os instrumentos necessários para poder assegurar a gestão dos recursos naturais e a sua justa distribuição. O caso é, sim, na sua raíz, um caso cultural.
Pintasilgo, M. L. (1985), Dimensões da Mudança, Porto: Edições Afrontamento, pag. 224.

Inteligência emocional e política

 
Há palavras-chave  que ouvimos com frequência neste tempo de dificuldades: credibilidade, competitividade, confiança. Mas parece-me que há outras que não podem ser esquecidas: inteligência emocional e cooperação.
A cooperação significa trabalhar com os outros para objectivos comuns. Parece, no entanto, que cooperação é a última coisa que interessa a alguns parceiros sociais e políticos.
Em vez de objectivos comuns, ouve-se a mesma ladainha (cassete) em relação a todas as medidas e propostas tomadas pelo governo, legitimado pelo voto democrático:
Acaba-se com os governos civis
            Isto não vai lá assim.
Acaba-se com os prémios aos melhores alunos do secundário
            Isto não vai lá assim
Não há tolerância no carnaval
            Isto não vai lá assim
Acaba-se com alguns feriados civis e religiosos
            Isto não vai lá assim
Tiram-se dois subsídios aos funcionários públicos
            Isto não vai lá assim
Acaba-se com algumas novas oportunidades
             Isto não vai lá assim
Altera-se o iva
            Isto não vai lá assim
Pagam-se as scuts
            Isto não vai lá assim
Vende-se a edp e a ren aos chineses..
            Isto não vai lá assim
Fazem-se nomeações como habitualmente
            Isto não vai lá assim
Tenta-se ajustar o currículo do ensino básico
            Isto não vai lá assim
Os alunos do 6º ano passam a fazer exames
            Isto não vai lá assim
Regulam-se os abusos do chamado rendimento social de inserção
            Isto não vai lá assim
Criam-se novas respostas para menos idosos morrerem sozinhos
            Isto não vai lá assim
Faz-se um acordo com a UGT e empresários
            Isto não vai lá assim
Tenta-se recapitalizar os bancos
            Isto não vai lá assim
Etc., etc. 
Para que servirão os parceiros sociais como os sindicatos e as associações empresariais se não houver cooperação? O que devemos pensar de parceiros sociais que durante mais de vinte anos, praticamente, nunca assinaram qualquer acordo ?
Como pode um país ter um desenvolvimento sustentado quando as oposições (não me refiro apenas às actuais) vivem da negação permanente de todas as medidas necessárias à gestão governativa ?
A cooperação é uma componente da inteligência emocional e está arredada da política. Pelos vistos a inteligência emocional é apenas para os indivíduos e para as empresas mas nada de a meter na cidadania. A palavra cooperação institucional tem sido usada entre algumas instituições principalmente quando surgem divergências entre essas instituições.
Mas, num momento de crise profunda, é necessária a inteligência emocional a todos os parceiros sociais e políticos, designadamente governos, sindicatos e empresários.
Mais uma vez vale a pena referir Maria de Lourdes Pintasilgo, Dimensões da mudança, que em 1985, tinha percebido que nos últimos tempos aconteceram demasiadas coisas importantes.
" Na verdade, são coisas demasiado importantes e vitais para nos limitarmos a visões ideológicas que são velhas de décadas ou mesmo de séculos. Outra perspectiva é necessária."
Depois do colapso económico o que nos continuam a vender os que são contra todas as medidas ? Que o problema é a economia. Não, não é.
“Se há um colapso óbvio, é o colapso da economia enquanto ciência e daqueles que a exprimem. É tempo que isto seja dito num contexto cultural.”(pag. 224)
A crise financeira e económica agravou-se actualmente mas o problema é de outra natureza. Há um mundo que mudou e as velhas instituições ainda não deram por isso.  

02/03/12

As fraquezas e as forças

Temos tendência a dividir a sociedade em duas partes, como acontece com a luta de classes, sempre com ideia de que os trabalhadores são os bons e os empresários são os maus da fita mas estes podem pensar que é exactamente ao contrário.
E há quem pense que a sociedade é isso e evolui dessa maneira: uns contra os outros, a luta de classes permanente, a guerra social contínua. Pode adoptar novas designações mas no fundo a clivagem dos bons contra os maus permanece. Dividir o mundo em bons e maus ou em "descomplexados competitivos" e "preguiçosos autocentrados" (P. Pereira) torna tudo mais facilmente entendível. Mas o mundo é muito mais complexo e não se coaduna com esta visão mecanicista da sociedade.

Refere P. Pereira que: "O curso de História, se tivesse feito parte do currículo do desempregado, colocá-lo-ia de imediato na categoria de "preguiçoso autocentrado", antiquado e inútil, "piegas" e queixoso, a quem é preciso dar um abanão de pobreza a ver se se torna "competitivo". Estamos, como já referi, perante uma nova forma de luta de classes: a que opõe "descomplexados competitivos" a "preguiçosos autocentrados".
Foi sempre mais fácil encontrar estereótipos sociais com este  dualismo simplificador que de facto não existe na realidade. Há trabalhadores competentes e incompetentes e empresários competentes e incompetentes. O que acontece é que o ser humano tem dentro de si as duas coisas: uma parte positiva e uma parte negativa que é, se quisermos,  o lado lunar (Carlos Tê/Rui Veloso)
Toda a alma tem uma face negra
Nem eu nem tu fugimos à regra
Tiremos à expressão todo o dramatismo
Por ser para ti eu uso um eufemismo
Chamemos-lhe apenas o lado lunar

O sr. Primeiro Ministro quer viver num país melhor e ele tem um lado positivo e também um lado piegas. (Não quero aqui deturpar a frase do sr. Primeiro Ministro que se referia aos alunos que deviam estudar e não ser piegas).  É como eu que tenho esses dois lados: um com grande vontade de trabalhar e de fazer todos os dias melhor e outro em que só me apetece ir para a praia, para o sul e para o sol.
O líder da oposição certamente quer um país melhor mas não vejo porque é que há-de ter o exclusivo da parte positiva e dizer que todas as medidas estão erradas e que as dele estão certas.
Será que todos os políticos se levantam todos os dias com a mesma disposição para trabalhar ? Ou será que não lhes ocorre que podem estar errados ? Quem os ouve falar é levado a pensar que não têm defeitos. Estão sistematicamente contra.
A realidade é que todos integramos o sistema social com as fraquezas e as forças que resultam das características de cada ser humano.
Defender um passado recente que quase nos deixou no desastre com a megalomania de viver com o dinheiro dos outros, sem vontade para mudar, essas são as fraquezas.
Olhar para o futuro com outra atitude, sem pieguice, essas são as nossas forças e ambas fazem parte de cada um de nós.